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A volta dos Bourbons

Marie-Anne Le Normand sempre alegou ser da realeza. Não só tinha simpatia pela família real em 1793 com, é claro, previu a Restauração de 1814-15 (mas não previu os “Cem dias de Napoleão”!). Era de se esperar que, depois de um pequeno livro celebrando o aniversário da morte de Joséphine, ela publicou La sibylle au tombeau de Louis XVI (A sibila no túmulo de Louis XVI, Paris, 1816) onde ela se encontra com um anjo que lhe narra a batalha de Waterloo através de um generoso vasto relato!!! ... Logo depois, em 1817, Les oracle sibyllins foi publicado. Esse volumoso livro é a continuação do seuSouvenirs prophétiques e no mesmo estilo, ela tenta provar que  previu a queda de Napoleão. Nós sabemos que o imperador gostava de ler as obras de Mlle Le Normand, mas que não acreditava na bizarra visão que tinha. Ela revela um pouco de sua técnica  e, particularmente, seu método de leitura de cartas. Ela, claramente, usa um jogo de piquet , ex. baralho de 32 cartas. Ela cortava três vezes e dispunha as cartas em oito montes. Então, começava as tirava e começava a leitura. Apesar de citar as cartas que tirou para a leitura, ela não tem problemas em descrever seu significados!
 

Algumas linhas a frente ela dá mais explicações: ‘o Rei de Espadas, junto com o 8 de ouros, significa que um homem habilidoso parou julgamentos, se possível, o avanço de uma doença ... Felizmente, o 9 de  copas, que está no topo, que verá, rapidamente, o fim de suas cruéis precupações’ (pp. 151-2). Como se pode ver, seu sistema é bem simples, sem nenhuma teoria elaborada. Uma grande revelação nos espera na página 159: O uso de CARTAS DE TARÔ – escrito tharots, na época – é, finalmente, mencionado por Mlle Le Normand. Como sempre, ela é bem vaga: ‘O louco, que estou tirando de sua mão significa que seus projetos são insustentáveis.’, diz ela (p.159), então: ‘Mas eu vejo o Diabo ao lado da Morte’ (p. 160). Nenhum significado é dado, mas uma vez que o consulente bateu em sua mesa e derrubou seua ’78 cartas de tharot’, podemos supor que não foram boas notícias. Os nomes das cartas de tarô mencionadas por Mlle Le Normand não podem ser encontradas no Grand Etteilla I, onde são chamadas, respectivamente: Folie, Force majeure e Mortalité. Fol, Diable e Mort são, atualmente, nomes clássicos no tarô de Marselha.

 

Outras técnicas divinatórias são mencionadas no resto do livro: économancie (ex.: previsão com uma bacia de água fresca com folhas de louro e verbena, mais sal!), o aço eléctre (que ‘só há na Europa’), os nove pontos do livro de Thoth (sem qualquer explicação), leitura de mãos, é claro (com uma grande nota 14), onomancia, com a clara do ovo, chumbo derretido, etc. Ela lista o que ela trazia consigo: ‘meus diferentes tharots, meu grande grimório, minhas famosas chaves [de Salomão], Cornélius Agrippa, minhas varas gregas, meu espelho mágico, o tratado dos sonhos, segundo Joseph, minha famosa varinha divinatória, 9 dracmas de chumbo fresco, sete pedaços de cera ... , borra de café o anel cigano’ (p. 337). Isso é, no mínimo, a parafernália de uma feiticeira. Nenhum método cartomantico é apresentado, mas há uma descrição de como Mlle Le Normand usa as suas varas gregas: ‘Pego minhas 33 varas gregas e jogo-as aqui e ali, numa área triangular, porém tiro, com cuidado, o terrível Agamenon e seus seguidores, fazendo isso de novo, sete vezes.’ (p. 196).


Em outubro, uma nova oportunidade foi dada à Mlle Le Normand para aumentar sua fama ‘internacional’. Para lutar contra Napoleão, o Czar Russo, o Imperador Austríaco e o Rei da Prússia, uniram-se, em 1815 no que foi conhecido como ‘Sainte-Alliance’. Em outubro e novembro de 1818 reuniu-se um congresso em Aachen para decidir o futuro da França. Marie-Anne Lenormand decidiu ir lá por sentir sua presença necessária. Para impressionar os monarcas a quem iria aconselhar, alugou uma carruagem, deixando Paris em grande ostentação. Mas foi parada na fronteira pela alfândega belga. O estranho equipamento que funcionários da alfandega encontraram na bagagem de Mlle Le Normand levantou suspeitas, então ela foi enviada para Toirnai e, então para Mons para que se descobrisse quais eram os seus planos. Aparentemente, nada perigoso, pois liberaram-na três dias depois. Depois do congresso, ela foi para Bruxelas onde, ela nos conta, foi fervorosamente recebida.

Pelo menos, todos esses eventos foram assunto para um novo livro que ela própria publicaria no ano seguinte, embora esteja datado 1818: La sibylle au congès d’Aix-la-Chapelle em 1818, sendo seu título feito, claramente, a partir do L’observateur au congrès, ou Relation historiques et anecdotiques du Congrès d’Alaix-la-Chapelle em 1818 (o oberservador no congresso, ou consideração históricas e pessoais do Congresso de Aachen, Paris, A. Eymery,1818). O último livro foi escrito pelo jornalista Charles-Maxime de Villemarest e dá conta da tão comentada presença de Mlle Le Normand em Aachen, descrevendo como ela, em primeira mão, espalhou rumores e situações de pessoas bem-informadas (pp.151-2). O livro da própria Mlle Le Normand, por outro lado, é mais um guia turístico, contando como ela foi para Bélgica – sob domínio da Holanda, então – foi parada por parada pela alfândega e, finalmente, chegou a Achen, da qual oferece uma descrição completa, emprestada, em grande parte, do Guide des étranger, de J.-B. de Bouge ou Itinéraires de la ville d’Aix-la-Chapelle (Guia do estrangeiro ou Passeios na cidade de Aachen, Bruxelas, 1806). Ela fala muito pouco sobre ter encontrado pessoas importantes lá, mas dedica uma grande parte à descrição de um encontro com um profeta chamado Muller. Muller tendo-a convidado a ir à Bruxelas, ela termina o livro com um tour pela capital belga.

 

Tarôs também são usados nesse livro. O índice traz um capítulo promissor intitulado ‘Y a-t-il quelque de philosophique dans les Tharots?’ (Há algo filosófico no Tarô?). Pelo menos iremos, aqui, saber o que Mlle Le Normand achava do tarô. Ela nos preparou para isso: Acionando sua ‘gande cabale’, ela divide suas figura egípcias (‘mês tableaux égyptiens’) em nove (p. 51). Ela comenta que, embora um baralho pareça algo frívolo, é merecedor de atenção filosófica. Mais a frente, ela descreve os utensílios familiares que lhes cercavam e menciona os tarôs, ‘figuras emblemáticas e hieroglíficas’ (p. 193). Depois de termos aguentado uma descrição completa de Aachen, chegamos agora, tremendo de emoção, ao centro da contribuição de Mlle Le Normand para a teoria do tarô. Decepcionantemente, o capítulo é somente a descrição de seu quarto no Hôtel de Bellevue. A única frase que ela dedica ao tarô é  seguinte: ‘mês tarots m’offrent de singulières réflexions’ (‘minhas cartas de tarô me oferecem algumas curiosas reflexões’)!
 

Uma das obras primas de Mlle Le Normand foi, certamente, Mémoires historiques et secrets de l’impératrice Joséphine, Marie-Rose Tascher de La Pagerie, première épouse de Napoleon Bonaparte; orné de cinq gravures, portrait et fac-similé (Paris, 1820, 2 vol.), onde ela conta a vida da primeira esposa de Napoleão. Não será surpresa se você ouvir dizer que a heroína da história é, na realidade, Mlle  Lenormand no seu papel de confidente e conselheira da imperatriz. Ela não deixa de mencionar seus destacar seus grande méritos e visões históricas. Alguns meses antes, um ‘Prospecto’ da assinatura anunciava o livro, alardeando ‘o luxo da tipografia, as finas gravuras’. Os compradores podiam assinar ‘au magasin de libraire, rue du Petit-Bourbon-St-Sulpice, nº 1’. Essa seria a última menção da livraria de Mlle Le Normand por nenhum dos dois volumes dar esse endereço. Os livros  seguintes não o mostram.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


 

 

 

 

"Memórias históricas e secretas da Imperartriz Joséphine"

 

O Mémoires historiques et secrets rapidamente levaram à reações negativas, J.-M. Deschamps, secretária particular de Joséphine, protestou com uma carta bastante sólida no Le Currier Constitutionnel and Le Courrier Français de 8 de novembro de 1820. Na La Gazzete de France de 4 de dezembro de 1820, Colnet mostrou que a obra era uma confusão de erros. Embora ela tente apresentar Joséphine de forma positiva, os admiradores de Napoleão chamaram de traição. O julgamento de Marquiset é duro: ‘é um romance cruel’, ‘quase tudo é falso na obra’ e, mais, ‘além desses anacronismos, o Mémoires são essencialmente a história de Napoleão sem imaginação e equivocadamente contada.’ Historiadores modernos não são menos críticos. Eles, geralmente, tomam a obra de Mlle Le Normand sobre Joséphine como puramente um logro. Para Pr. Jean Tulard eles são ‘inteiramente apócrifos’.


Apesar disso, o Mémoires historiques deve ter tido algum sucesso e pode ter sido o primeiro best-seller publicado por Mlle Le Normand. Chegou a segunda edição aumentada com as últimas palavras de Napoleão em Saint Helena acrescentadas. Sua fama cruzou fronteiras: Mémoires historiques foi traduzido para o alemão em 1822 sob o título: Historische und geheine Denkwürdigkeiten der Kaiserin Josephine,... ersten Gemahlin Napoleon Bonaparte..., traduzido por August von Blumröder e publicado pela Sondershausen. Finalmente, uma tradução para o inglês, feita por Jacob M. Howard apareceu nos Estados Unidos, em 1847, em Chicago e na Filadélfia, simultaneamente: Historical and secret memoirs of the empress Joséphine (Marie-Rose Tascher de La Pagerie), firt wife of Napoleão Bonaparte. Translated from the French by M. Howard. Foram reeditados várias vezes em 1848, 1850, 1852, 1854 e mais tarde, até a virada do século.


Parece que Mlle Le Normand se sentiu humilhada com a reação sarcástica da imprensa parisiense. Em 25 de fevereiro de 1821 ela deixou Paris e se estabeleceu em Bruxelas. Os clientes vieram, rapidamente, consultar seus oráculos. Mas a polícia foi igualmente rápida em prendê-la, e Mlle Le Normand foi detida em 18 de abril de 1821. Após prestar depoimentos e passar por revistas, ela foi indiciada por fraude e levada a julgamento em Louvain. Em 7 de junho ela foi sentenciada a 1 ano de prisão e multada em 3 florins. Ela entrou com recurso contra a sentença, sendo novamente levada a julgamento perante a corte de Bruxelas. A sentença de prisão foi retirada e Mlle Le Normand multada em 15 francos que se recusou a pagar. Livre, Mlle Lenormand deixou Bruxelas em 15 de agosto de 1821.

 

Toda essa história deu origem a um novo livro.Souvenirs de la Belgique foi publicado em 1822, ‘à Paris, chez l’auteur, rue de Tournon, nº 5, et MM. les principaux libraire de la capitale’. Marie-Anne Le Normand conta-nos duas memórias de ‘100 dias de má sorte’, aos quais acrescenta suas ‘notas históricas e políticas’. O livro foi ilustrado com um retrato da autora em sua prisão em Bruxelas. Como nas obras anteriores, há notas de rodapé e finais; há, até mesmo, notas de rodapé para as notas finais! As 415 páginas são salpicadas com lições de história, digressões de fatos, e citações em francês, latin e até inglês (sem qualquer referência). É uma narrativa fantasiosa do que que aconteceu do começo ao fim, no seu obsessivo desejo de provar que estava certa, ela anexa 80 páginas de documentos autênticos (declarações de testemunhas, minutas de audiências, memorandos que foram publicados em defesa de sua posição).
 

Todas as ‘vítimas’ cartas comuns e de tarô usadas para previsões. Como em seu Sibylle au congrès d’Aix-la-chapelle, Mlle Le Normand evita responder perguntas diretas sobre o tarô. No capítulo intitulado ‘Mon interrogatoire’ (meu interrogatório), onde ela reporta perguntas e respostas à sua maneira, um consulente pergunta: ‘O que esses tharots , que parecem ter hieróglifos, significam?’ (p.39). Mas sua reposta tem a ver com quiromancia!

 

De volta à Paris, Marie-Anne Le Normand dedicou-se a escrever uma pilha de livros,  os quais aparecem em várias listas em suas obras publicadas. Em outubro de 1824, logo após a morte de Louis XVIII, ela publicou uma visão do ‘anjo protetor da França no túmulo de Louis XVIII’, no qual previu um longo de feliz reinado de Carlos X – que foi deposto pela Revolução de 1830. A morte do Czar Alexander I, em 1825 inspirou um novo canto na sobra de Catherine II em seu túmulo. Ela oferece uma assinatura de quarenta e quatro obras adicionais seus; entre os quais foram anunciados, mas nunca apareceram, foram suas próprias memórias e livros sobre o filho de  Joséphine, Eugène de Beauharnais e sobre a Rainha Guilhermina.
 

De acordo com Dicta Dimitriadis, Mlle Le Normand viajou para Londres, de novo, em 1822 e juntou-se a uma sociedade chamada ‘Membros of Mercurii’; ela chegou a dirigir uma revista intitulada The Straggling astrologers of the 19th century, em 1824. Tudo isso é contradito por uma carta de Mlle Le Normand e, 20 de janeiro de 1823 para Messrs. Truttel e Würtz, comerciantes de livros, em Paris, negociando a venda de três dúzias de cópias de seu Souvenirs de la Belgique por 178 francos e esperando aumentar os negócios com eles durante ‘esse ano, 1823’. É difícil imaginar como ela poderia estar vivendo em Londres entre 1822 e 1824, naquela época, quando estava publicando seu Souvenirs de la Belgique (1822), em Paris, e então, L’ange protecteur de la France ao tombeau de Louis XVIII (1824)! Como era de se esperar, ela nunca fez alusão à essas maravilhosas aventuras em suas publicações posteriores.

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